A Confissão de Fé Escocesa - Capítulo 22


22º CAPÍTULO

Da Reta Administração dos Sacramentos

Duas coisas são necessárias para a reta administração dos sacramentos. A primeira é que eles devem ser ministrados por ministros legítimos; e declaramos que tais são apenas os que são designados para a pregação da Palavra, em cujos lábios pôs Deus a Palavra de exortação e que estes são os que são para isso legitimamente escolhidos por alguma Igreja. A segunda é que devem ser ministrados com os elementos e da maneira que Deus estabeleceu; de outra forma, afirmamos que deixam de ser os sacramentos corretos de Jesus Cristo.
Esse o motivo por que abandonamos a sociedade da Igreja pontifícia e fugimos à participação dos seus sacramentos. Primeiramente, porque seus ministros não são ministros de Jesus Cristo (o que é mais horrendo é que eles permitem que mulheres batizem, quando a estas o Espírito Santo não permite ensinar na congregação). Em segundo lugar, porque adulteraram de tal modo um e outro sacramentos com as suas próprias invenções que nenhuma parte do ato original de Cristo permanece em sua simplicidade original. O óleo, o sal, o cuspo e outras coisas, no batismo, são simples invenções humanas; a adoração ou veneração do sacramento, o transportá-lo pelas ruas e praças das cidades, a conservação do pão num escrínio ou cápsula, não é o uso legítimo do sacramento do corpo de Cristo, mas simples profanação dele. Cristo disse: "Tomai e comei", e "Fazei isto em memória de mim."1 Por estas palavras e por esta ordem ele santificou o pão e o vinho para sacramento do seu corpo e do seu sangue, de modo que um seria comido e todos bebessem do outro, e não que se conservem, e se adorem e honrem como Deus, como até agora fizeram os pontifícios, que, subtraindo ao povo o cálice da bênção, praticaram um horrendo sacrilégio.
Além disso, para uso correto dos sacramentos, requer-se que o fim e a causa da sua instituição sejam entendidos e observados não menos pelos comungantes do que pelos ministros. Se a intenção no participante se mudar, cessa o uso correto, o que é muito evidente na rejeição dos sacrifícios (assim como também se o ministro ensinar doutrina claramente falsa, o que seria odioso e detestável diante de Deus), ainda que os sacramentos sejam instituições dele próprio, porque homens ímpios deles usam para fim diverso daquele para que foram ordenados por Deus. Afirmamos que isto foi feito aos sacramentos na Igreja Pontifícia, na qual toda a ação de Jesus Cristo é adulterada, tanto na forma exterior, como no fim e na concepção. O que Cristo fez e ordenou que se fizesse é evidente dos Evangelistas e de São Paulo; o que o sacerdote pontifício faz junto do altar não é necessário repetir. O fim e a causa da instituição de Cristo, e por que o que ele instituiu deve ser feito por nós, exprime-se nestas palavras: "Fazei isto em memória de mim"; "Todas as vezes que comerdes deste pão e beberdes deste cálice, anunciais" isto é, enalteceis, pregais, engrandeceis e louvais – "a morte do Senhor, até que ele venha".2 Mas qual é o fim, qual a concepção com que os sacerdotes dizem a sua missa; revelem-no as suas próprias palavras na missa: e é que, como mediadores entre Cristo e sua Igreja, eles oferecem a Deus o Pai um sacrifício propiciatório pelos pecados dos vivos e dos mortos, doutrina blasfema porque anula a suficiência do sacrifício único de Cristo, uma vez oferecido para a purificação de todos os que são santificados. Nós aborrecemos, detestamos e repudiamos profundamente essa blasfêmia contra o próprio Jesus Cristo.3

1. Mt 26:26; Mc 14:22; Lc 22:19; 1Co 11:24.
2. 1Co 11:24-26.
3. Hb 9:27-28; 10:14.
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Comentário: Há muita superstição no que diz respeito aos sacramentos. De fato, há mais superstição do que biblicidade. Desde o começo da igreja, a história está cheia de desvios com relação aos sacramentos, em especial a Ceia do Senhor. Ora mistura, ora super ênfase, ora desprezo, assim vão os erros. Eles não têm fim. Sacramentos, eis o ponto nevrálgico. Falsos ministros, não alinhados com a Palavra de Deus, vão repetindo os erros milenares dos antepassados. Pelo menos no que diz respeito a Igreja de Roma, isso é verdadeiro. Mas o outro lado não está isento, quando esvazia completamente de significado, tornando o sacramento apenas um memorial. Assim, tanto o batismo quanto a Ceia do Senhor são alvo de horríveis e impiedosos ataques. Há igrejas que chamam o batismo e a ceia do Senhor ordenanças e não sacramentos, com medo de torná-los algo supersticioso. Seguindo esse desprecio outros seguimentos religiosos, que nem podemos considerar igreja, fazem “santa ceia da cura divina” e até “santa ceia da prosperidade”. Completo desatino. É tão simples seguir o ensino das escrituras, Antigo e Novo Testamentos, e a catolicidade histórica-doutrinária da Igreja de Jesus Cristo. Circuncisão e Páscoa eram mandamentos, sim, mas continham mais, eram “selos da justiça da fé” (Romanos 4.11), selos das promessas da Aliança. Da mesma forma Batismo e Ceia são ordenanças ou mandamentos, mas contêm mais, eles selam e confirmam cada uma das promessas de Deus aos cristãos. “A promessa vos diz respeito a vós, a vossos filhos, e a todos os que estão longe: a tantos quantos Deus nosso SENHOR chamar” (Atos 2.39). Por isso são chamados de sacramentos. Um sacramento envolve mistério sagrado. Não é o ministro que abençoa os sacramentos, estes trazem a bênção consigo. No caso da Ceia do Senhor, embora não comamos a sua carne fisicamente nem bebamos seu sangue, porque os elementos não são transubstanciados, contudo, ela não é uma ceia comum. Jesus está conosco, em espírito, mas da mesma forma que esteve com os discípulos. “E digo-vos que, desde agora, não beberei deste fruto da vide até àquele dia em que o beba de novo convosco no reino de meu Pai” (Mateus 26.29). De modo que é a bênção que ele pronunciou sobre os elementos a mesma que recebemos naquele momento.

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