A Confissão de Fé Escocesa - Capítulo 21
21º
CAPÍTULO
Dos
Sacramentos
Assim
como os patriarcas sob a Lei, além da realidade dos sacrifícios,
tinham dois sacramentos principais, isto é, a circuncisão e a
páscoa, e aqueles que os desprezavam e negligenciavam não eram
contados entre o povo de Deus,1
assim nós também reconhecemos e confessamos que agora, na era do
Evangelho, só temos dois sacramentos principais, instituídos por
Cristo e ordenados para uso de todos os que desejam ser considerados
membros de seu corpo, isto é, o Batismo e a Ceia ou Mesa do Senhor,
também chamada popularmente Comunhão do seu Corpo e do seu Sangue.2
Esses sacramentos, tanto do Velho Testamento como do Novo, foram
instituídos por Deus, não só para estabelecer distinção visível
entre o seu povo e os que estavam fora da Aliança, mas também para
exercitar a fé dos seus filhos e, pela participação de tais
sacramentos, selar em seus corações a certeza da sua promessa e
daquela associação, união e sociedade mui felizes que os
escolhidos têm com seu Cabeça, Jesus Cristo.
E,
assim, condenamos inteiramente a vaidade dos que afirmam que os
sacramentos não são outra coisa que meros sinais desnudos. Muito ao
contrário, cremos seguramente que pelo Batismo somos enxertados em
Jesus Cristo, para nos tornarmos participantes de sua justiça, pela
qual todos os nossos pecados são cobertos e perdoados; cremos também
que na Ceia corretamente usada, Cristo se une de tal modo a nós, que
se torna o próprio alimento e sustento de nossas almas.3
Não que imaginemos qualquer transubstanciação do pão no corpo
natural de Cristo e do vinho em seu sangue natural, como têm
ensinado perniciosamente os pontifícios e como creem para sua
condenação; mas essa união e associação que temos com o corpo e
o sangue de Jesus Cristo no uso reto dos sacramentos se realiza por
meio do Espírito Santo, que pela verdadeira fé nos transporta acima
de todas as coisas visíveis - que são carnais e terrenas - e nos
habilita a alimentar-nos do corpo e do sangue de Jesus Cristo, uma
vez partido e derramado por nós, e que agora está no céu e se
apresenta por nós na presença do Pai.4
Não obstante a distância entre o seu corpo agora glorificado no céu
e nós mortos aqui na terra, contudo cremos firmemente que o pão que
partimos é a comunhão do corpo de Cristo e o cálice que abençoamos
é a comunhão do seu sangue.5
Assim, confessamos, e cremos, sem nenhuma dúvida, que os fiéis,
mediante o uso reto da Ceia do Senhor, comem o corpo e bebem o sangue
de Jesus Cristo, porque ele permanece neles e eles nele; eles, até,
se tornam carne da sua carne e osso dos seus ossos6
de maneira tal que, como a Divindade eterna conferiu à carne de
Jesus Cristo vida e imortalidade,7
assim também o comer e o beber da carne e do sangue de Jesus Cristo
nos confere essas prerrogativas. Declaramos, contudo, que isto não
nos é dado só na ocasião do sacramento, nem pela sua ação ou
virtude; mas afirmamos que os fiéis, mediante o uso certo da Ceia do
Senhor, têm com Jesus Cristo,8
uma união que o homem natural não pode compreender. Além disso
afirmamos que, embora os fiéis, impedidos pela negligência e pela
fraqueza humana, não aproveitem tanto quanto desejariam, na própria
ocasião em que se celebra a Ceia, no entanto subsequentemente ela
produzirá frutos, sendo semente viva semeada em boa terra, pois o
Espírito Santo, que nunca pode estar separado do uso reto da
Instituição de Cristo, não privará os fiéis do fruto dessa ação
mística. Mas tudo isto, dizemos, vem da verdadeira fé que apreende
Jesus Cristo, o único que faz o sacramento eficaz em nós. Portanto,
todos os que nos difamam dizendo que afirmamos ou cremos que os
sacramentos não são outra coisa que sinais desnudos e vazios,
fazem-nos injustiça e falam contra a verdade manifesta. Isto, no
entanto, admitimos livre e espontaneamente, que fazemos distinção
entre Cristo em sua substância eterna e os elementos dos sinais
sacramentais. Assim, nem adoramos os elementos em lugar do que eles
significam, nem os julgamos dignos de adoração, nem os desprezamos,
ou interpretamos como inúteis e vãos, mas deles participamos com
grande reverência, examinando-nos a nós mesmos o mais
diligentemente antes de participarmos deles, pois somos persuadidos
pelos lábios do apóstolo, de que "aquele que comer o pão ou
beber o cálice do Senhor, indignamente, será réu do corpo e do
sangue de Jesus Cristo".9
1.
Gn 17:10-11; Êx 23:3,etc.; Gn 17:14; Nm 9:13.
2.
Mt 28:19; Mc 16:15-16; Mt 26:26-28; Mc 14:22-24; Lc 22:19-20; 1Co
11:23-26.
3.
1Co 10:16; Rm 6:3-5; Gl 3:27.
4.
Mc 16:19; Lc 24:51; At 1:11; 3:21.
5.
1Co 10:16.
6.
Ef 5:30.
7.
Mt 27:50; Mc 15:37; Lc 23:46; Jo 19:30.
8.
Jo 6:51; 6:53-58.
9.
1Co 11:27-29.
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Comentário:
A
kahal no Antigo Testamento participava,
como
a Igreja no Novo Testamento participa de dois sacramentos. A antiga
congregação, que
servia ainda nas sombras um Cristo velado, possuía a circuncisão e
a páscoa. A nova congregação do Senhor, que serve o Cristo
revelado, tem o batismo e ceia em lugar da circuncisão e da páscoa,
respectivamente. As
duas ordenanças são muito importantes para a vida da Igreja. Erram,
portanto, aqueles que desprezam os sacramentos como se fossem coisa
de pouco valor espiritual.
A
circuncisão dos prepúcios não salvavam os circuncidados, por isso
Deus falou muitas vezes que eles precisavam da circuncisão do
coração. Mas aquela circuncisão que recebiam em sua carne era um
selo que os colocava sob as promessas da Aliança de Deus com seu
povo. Cada circuncidado passava a ser um membro da nação de Israel
e da Kahal. Da mesma forma o batismo com água, em nome do Pai, do
Filho e do Espírito Santo, não salva automaticamente, mas é um selo que coloca o
batizado sob as promessas do Evangelho. Cada batizado é considerado
membro do
povo de Deus e da Igreja de Cristo. Quando
um judeu participava da páscoa, comendo a carne do cordeiro, não
havia a superstição de que ele estivesse comendo a carne do
Messias, Cristo, propriamente.
Contudo, a páscoa não era uma refeição comum, mas havia um
profundo significado espiritual nela, era uma refeição espiritual,
de fato Deus os alimentava na fé, na confiança e esperança da
salvação e vida eterna. Da mesma forma quando participamos do
sacramento da Ceia hoje, não temos a superstição de estarmos
comendo literalmente a carne de Cristo, mas ela também não é uma
refeição comum, como alguns afirmam. Não, a Ceia do Senhor é
profundamente espiritual. Nela recebemos a bênção do próprio
Senhor Jesus, quando a instituiu dizendo do pão: “tomai e comei,
este é o meu corpo partido por vós”; e do vinho: “bebei dele
todos, este é o meu
sangue,
o
sangue
da nova aliança”. Na mesa do Senhor somos alimentados espiritualmente, fortalecidos na fé e firmados na esperança da vida eterna. Por
isso o apóstolo advertiu a que ninguém coma e bebe de forma indigna
porque faria isso para sua própria condenação.
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