A Confissão de Fé Escocesa - Capítulo 14



14º CAPÍTULO

As Obras que são Consideradas Boas diante de Deus

Confessamos e reconhecemos que Deus deu ao homem sua santa Lei, na qual não só se proíbem as obras que desagradam e ofendem sua divina majestade, mas também se ordenam todas aquelas que lhe agradam e que ele prometeu recompensar.1 Essas obras são de duas espécies. Umas são praticadas para a honra de Deus e as outras para benefício de nosso próximo, e ambas têm a vontade revelada de Deus como sua garantia.
Ter um só Deus, adorá-lo e honrá-lo, invocá-lo em todas as nossas dificuldades, reverenciar o seu santo nome, ouvir a sua Palavra e crer nela, participar dos seus santos sacramentos, são obras da primeira espécie.2 Honrar pai, mãe, príncipes, governantes e poderes superiores, amá-los, sustentá-los, obedecer às suas ordens - se estas não são contrárias aos mandamentos divinos - salvar as vidas dos inocentes, reprimir a tirania, defender os oprimidos, conservar nossos corpos limpos e santos, viver em sobriedade e temperança, tratar de modo justo todos os homens tanto por palavras como por obras e, finalmente, reprimir quaisquer desejos pelos quais nosso próximo recebe ou pode receber dano,3 são as boas obras da segunda espécie, as quais são mui gratas e aceitáveis a Deus, visto que ele mesmo as ordenou.
Os atos contrários são pecados dignos da maior indignação, que sempre lhe desagradam e o provocam à ira. São eles: não invocar só a ele quando temos necessidade, não ouvir com reverência a sua Palavra, mas desprezá-la e rejeitá-la, ter ou adorar ídolos, alimentar e defender a idolatria, fazer pouco do venerável nome de Deus, profanar, abusar ou desprezar os sacramentos de Jesus Cristo, não obedecer ou resistir aos que Deus colocou em autoridade, enquanto se mantenham dentro dos limites da sua vocação,4 cometer homicídio ou ser conivente com homicídio, odiar o próximo, permitir que seja derramado o sangue inocente, se podemos impedi-lo.5 Em conclusão, confessamos e afirmamos que a quebra de qualquer mandamento da primeira ou da segunda espécie é pecado,6 pelo qual se acende a ira de Deus contra o mundo soberbo e ingrato. Assim, afirmamos serem boas obras somente as que são praticadas com fé,7 segundo o mandamento de Deus,8 que, em sua lei, expôs o que lhe agrada. Afirmamos que as obras más não são apenas as que se praticam expressamente contra o mandamento de Deus,9 mas também as que em assuntos religiosos e de culto a Deus, não têm outro fundamento senão a invenção e a opinião do homem. Desde o princípio Deus as vem rejeitando, como aprendemos das palavras do profeta lsaías10 e de nosso Senhor Jesus Cristo: "Em vão me adoram, ensinando doutrinas que são mandamentos de homens".11

1. Êx 20:3, etc.; Dt 5:6, etc.; 4:8.
2. Lc 10:27-28; Mq 6:8.
3. Ef 6:1,7; Ez 22:1,etc.; 1Co 6:19-20; 1Ts 4:3-7; Jr 22:3, etc.; Is 50:1, etc.; 1Ts 4:6.
4. Rm 13:2.
5. Ez 22:13, etc.
6. 1Jo 3:4.
7. Rm 14:23; Hb 11:6.
8. 1Sm 15:22; 1Co 10:31.
9. 1Jo 3:4.
10. Is 29:13.
11. Mt 15:9; Mc 7:7.

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Comentário: A lei de Deus tem um aspecto negativo, estabelecendo um limite, proibindo ultrapassarmos essa marca, e tem um aspecto positivo, o qual nos exorta a atingir a meta estabelecida. Assim, tanto a transgressão da lei quanto a nossa omissão diante dela mostra que estamos fora do esquadro, que não estamos em linha com a vontade de Deus e estamos em falta. E segundo o ensino apostólico, se tropeçarmos num só dos mandamentos, seremos culpados pela transgressão e omissão de toda a lei - Porque qualquer que guardar toda a lei, e tropeçar em um só ponto, tornou-se culpado de todos (Tiago 2.10). A lei de Deus e toda sua explanação que nos foi feita pelos profetas e apóstolos nos estimula à prática das boas obras. Ela não é passiva mas ativa e sempre nos motiva a fazer algo, a dar, a nos aplicar - Portanto, tudo o que vós quereis que os homens vos façam, fazei-lho também vós, porque esta é a lei e os profetas – (Mateus 7.12). A Bíblia não diz: “o que não queres para ti mesmo não faças para os outros”. Isso seria passividade. Mas ela diz que o que gostaríamos que nos fizessem, por ser isso bom, então que façamos isso para os outros, mesmo que não recebamos nada em troca. Deus se agrada disso, de pessoas que fazem algo pelos outros, que se doam, que se prestam serviço, que compartilham, que repartem. E mais, tudo isto deve ser feito por fé, isto é, por amor a Deus, como sendo para Deus. Isso são boas obras agradáveis a Deus. Deus se ira contra todo tipo de pecado, contra todos os pecados que cometemos. Por isso que necessitamos urgente e desesperadamente do Mediador, Nosso Senhor Jesus Cristo. Mas os piores pecados que se podem cometer contra Deus, dizem respeito ao seu culto. Quando diz respeito ao seu culto, ele não quer criatividade, não quer nossa opinião, não quer invenção, não quer contextualização, não quer upgrade, mas deseja apenas nossa observação obediente e reverente. Grave pecado é oferecer a Deus um culto modificado, adulterado, diferente do que ele prescreveu em sua Palavra. Nossa geração, talvez mais do que qualquer outra, tem pecado por adulterar o serviço sagrado, misturando o profano ao santo, o material ao espiritual, introduzindo coisas mundanas, voltando as sombras da Antiga Aliança, judaizando a igreja. Em muitas chamadas igrejas hoje, o que se vê, é uma mistura de paganismo, superstições, idolatria e até feitiçaria, shows de danças e coreografias acompanhados por dezenas de instrumentos inanimados e luzes estroboscópicas. Dirigentes que são verdadeiros animadores, ministrações que são palestras motivacionais em lugar das antigas pregações expositivas da Bíblia. Em vez de edificar as almas dos crentes, entretém os descrentes e os deixa confortáveis em seus pecados. Mas o pior de tudo é que o culto solene e pactual foi substituído por essas aberrações e a glória de Deus foi desprezada. Por isso a suposta adoração de grandes setores da chamada igreja hoje é absolutamente vã, pecaminosa, de nenhum proveito e atrai a ira do Deus Santo. Que Deus nos ajude. Amém.

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